Rodrigo Cardoso da Silva | IFB
Edilene Vilas Bôas Benevides Corrêa | UnB
O ano de 2020 inicia com a identificação de uma variante do SARS COV 2, a Covid-19. O Brasil teve seu primeiro caso em fevereiro de 2020. A Organização Mundial de Saúde (OMS) orienta a população mundial a adotar as medidas de segurança para conter a disseminação do vírus, ou seja, o distanciamento social, a proibição de aglomerações, a suspensão das viagens, o uso de máscaras e o lockdown dentre outras medidas. O setor de eventos foi um dos primeiros a ser impactado.
Em abril de 2020 uma pesquisa realizada pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) em parceria com empresas e associações da área de eventos constatou que a pandemia impactou negativamente 98% das empresas do segmento de eventos com uma média de 12 eventos cancelados por empresa¹.
Outro ponto identificado na referida pesquisa foi que 54% das empresas precisaram adotar medidas em relação aos empregados, demissão e/ou redução de salário e direitos trabalhistas e também inovar na forma de atuar: trabalho em Home Office, presença digital, eventos online, etc.
Fonte: acervo do Aeroporto Internacional de Brasília.
Diante do exposto acima, o presente trabalho tem por objetivo o estudo da área de eventos do Distrito Federal – DF aprofundando o conhecimento sobre o mercado de eventos, suas relações trabalhistas e a precarização das condições de trabalho no contexto da pandemia da Covid-19.
A metodologia para a pesquisa foi dividida em duas partes: A primeira consistiu em realizar pesquisa quantitativa, com análise de dados secundários do IBGE e DATASEBRAE (entre outros) para entender alguns números relevantes sobre o mercado de eventos, especificamente sobre 19 atividades da Classificação de Atividades Econômicas (CNAE). A parte qualitativa da pesquisa se deu com a revisão literária de conceitos e categorias relevantes ao estudo bem como a realização de entrevistas semiestruturadas. As entrevistas foram analisadas pela técnica da análise do conteúdo sendo utilizada a ferramenta da análise temática que, de acordo com (BARDIN, 2011) possibilita auxiliar na construção de respostas para a questão problema da pesquisa.
Como um dos principais resultado da pesquisa ressalta-se que, no contexto da Covid-19, houve uma expansão maior do número de empresas e de microempreendedores individuais do que trabalhadores formais no setor de eventos, alargando a informalidade, precarização, baixa remuneração e direitos limitados dos trabalhadores de eventos².
O setor de eventos tem uma naturalização de ocupações ocasionais e específicas, que favorecem a terceirização, contratos intermitentes, informalidade, em resumo, um segmento à margem e sujeito à precarização de sua força de trabalho, ou seja, um segmento que já nasce precarizado.
A precarização do trabalho consiste na desconexão do trabalho, do direito a ter direitos e, principalmente, do direito ao que é produzido (Valencia, 2016).
Segundo Meliani (2011, p.141) o termo precariedade remete à “inexistência de duração e solidez, ou seja, aquilo que é descontínuo, curto, fugaz, fugidio”. É a ausência de segurança ou estabilidade que permite às pessoas usufruírem de direitos fundamentais, ou seja, direito à dignidade.
Um ponto interessante identificado na pesquisa é a inexistência de empregados em empresas como, produção de espetáculos circenses, de marionetes e similares e nas empresas de criação de estandes para feiras e exposições. Como podem existir empresas sem funcionários? Levando-se a crer que, em muitos casos o “patrão” ocupa, ao mesmo tempo, a função de “empregado”, com um indicativo do processo de precarização do trabalho neste mercado e o empreendedorismo por necessidade e não por oportunidade.
Durante as entrevistas, foi perceptível que algumas emoções afloravam dos entrevistados, captamos os seguintes elementos: ansiedade, insegurança e incerteza estão presentes em todos os relatos e apesar de não fazer nenhuma pergunta relacionada diretamente com os sentimentos e emoções, era elemento latente na entrevista, principalmente sobre o futuro da atividade.
As pesquisas indicam que antes da pandemia os trabalhadores de eventos já passavam por um processo de instabilidade nas suas relações de trabalho, e a chegada da Covid-19 aumentou significativamente o empreendedorismo como uma forma de escamotear as relações de trabalho terceirizado e precarizado³.
A pesquisa possibilitou conhecer melhor as nuances do trabalho no setor de eventos, principalmente o seu agravamento durante a pandemia da Covid-19 bem como estabelecer um comparativo com a realidade do trabalhador precarizado do segmento frente ao trabalhador formal com carteira assinada, cotejados aspectos da realidade nacional e daquela verificada especialmente no âmbito do DF⁴.
Uma questão que veio à tona durante a pesquisa é que o segmento não possui representações que defendam os direitos dos trabalhadores do setor. São raras as organizações de apoio ao trabalhador. No entanto, identificamos que há uma grande quantidade de entidades patronais, todas com o olhar voltado para os interesses do mercado e do empresariado.
Referências
Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo. 70. ed. São Paulo: Almedina Brasil.
DATASEBRAE (2020). Indicadores e números sobre CNAES. Disponível em https://datasebraeindicadores.sebrae.com.br/ – Acesso em 03 de nov. de 2020.
Meliani, P. F. (2012). Estrutura e distribuição espacial do trabalho formal e informal no turismo do Brasil: contributos geográficos ao planejamento turístico regional brasileiro. Revista Turismo e Desenvolvimento n. 17/18 – P. 467 – 478.
SEBRAE (2020). Agência Sebrae de Notícias. Pesquisa mostra que pandemia do coronavírus afetou 98% do setor de eventos. Caderno: Diversão e Turismo. Editora Globo. Disponível em: https://revistapegn.globo.com. Acesso em 23 nov. 2020.
Valencia, Adriàn Sotelo (2016). Precariado ou proletariado? Bauru: Canal 6, 2016.
Zanella, L (2012). Manual de Organização de eventos: planejamento e operacionalização. Ed. Atlas.
¹Evento é uma reunião, formal ou informal, de pessoas em local, data e horários definidos, com o objetivo de celebrar momentos especiais, estabelecer contatos, promover marcas etc. (Zanella, 2012)
²Dependendo do evento a ser realizado às vezes são necessárias mais de 50 especialidades profissionais gerando um grande quantitativo de ocupações temporárias e ocasionais (SEBRAE, 2010).
³De maneira geral as empresas que trabalham com eventos são formadas por uma maioria de pequenas empresas e microempreendedores, sendo uma grande quantidade sem empregados.
⁴A falta de informações, como Códigos Brasileiros de Ocupações (CBOs) específicos para a atividade, dificultou a pesquisa e um olhar mais efetivo sobre o segmento.
Comments