Bianca Paes G. dos Santos | Mestranda em Turismo (EACH/USP)
O Diretor de Regulamentação e Convenções Coletivas do Sindicato Nacional dos Aeronautas (SNA), Clauver Castilho, conversou com a equipe do Labor Movens, na última sexta-feira (26/11), enquanto estava em Brasília em reuniões de negociação com o Tribunal Superior do Trabalho (TST) para a renovação da convenção coletiva.
Quem compõem a categoria
De modo muito didático Clauver explica que na aviação existem duas categorias: aeronautas e aeroviários. A categoria dos aeronautas envolve todos aqueles que estão no avião: comandantes, copilotos e comissários. Os aeroviários são os que trabalham em terra em atividades como serviços administrativos, check-in e mecânicos.
O SNA é uma entidade representativa da classe dos aeronautas de abrangência nacional com mais de 85% da categoria associada ao sindicato, portanto, com alta representatividade. Segundo Clauver, no Brasil, são mais de 15 mil tripulantes na aviação regular, sendo quase 13 mil associados ao SNA.
O impacto da (contra)reforma trabalhista
O principal impacto da (contra)reforma trabalhista para os aeronautas foi o fim da ultratividade das convenções coletivas. Em termos práticos, isso significa que antes quando uma convenção coletiva não conseguia ser renovada, ela permaneceria vigente até que outra fosse estabelecida. Agora, todos os acordos coletivos com cláusulas sociais, operacionais e econômicas se findam ao término da validade do acordo, independentemente de ter havido renovação da convenção ou não, colocando em risco todos os direitos adquiridos pela categoria.
O diretor explica que o fim da ultratividade deixou a categoria dos aeronautas muito vulneráveis.
“Antes, se você não convencionou, se você não chegou em um acordo, todos aqueles direitos e obrigações dentro da convenção coletiva se mantinham. O fim da ultratividade acabou com tudo isso... todo direito tá em risco. [...] Antes da reforma trabalhista, se a gente não chegasse em um consenso, todas aquelas regras continuariam ali. Aí te coloco como regras, vale alimentação, salário maternidade, jornada maternidade, auxílio creche, vários e vááários direitos que estão podendo ser findados com esse movimento”.
Antes da reforma trabalhista, caso os trabalhadores e as empresas não chegassem em um novo acordo, mantinha-se o que estava acordado antes. Agora, simplesmente se retira o acordo, colocando em risco muitos direitos adquiridos. No caso dos aeronautas, há direitos conquistados há mais de 30 anos que estão em risco com o fim da ultratividade.
Ainda sobre os efeitos da (confra)reforma trabalhista, Clauver comenta que o SNA é um Sindicato Nacional e com amplo número de associados e boa representatividade da categoria, por isso conseguem algumas negociações, porém sindicatos menores foram muito fragilizados e perderam suas ferramentas de negociação.
Contextualização do pleito
Com o início da pandemia no Brasil, o SNA foi, de acordo com Clauver, um dos primeiros sindicatos a adotar medidas de acordos coletivos de trabalho com redução de salários e jornadas. Os cortes aconteceram já em março do ano passado e algumas empresas adotaram acordos coletivos com redução média de até 70% do salário dos trabalhadores. “O salário do comandante, copiloto e comissário é composto por um salário fixo e um salário variável que é determinado por hora ou quilometro voado” explica o diretor.
Em razão do avanço da pandemia, percebeu-se que a crise seria mais extensa do que o esperado e, assim, foram adotados mais 139 acordos coletivos de trabalhos, envolvendo a aviação regular, o taxi aéreo e aviação geral.
A última convenção coletiva, que determinaria os acordos vigentes para o ano de 2021, aconteceu em janeiro, em meio à segunda onda da pandemia, e o grande pleito das empresas foi o reajuste fosse zero. Naquele momento, a categoria entendeu a situação e concordou. “A gente não teve nada de reajuste na renovação coletiva do ano passado, mesmo tendo tido as reduções salariais” afirma Clauver.
Diante do cenário de melhoria da pandemia e retomada das atividades do setor, algumas empresas já estão demonstrando bons índices de recuperação ao mercado. Então Clauver explica a posição da categoria nas negociações da convenção coletiva desse ano:
“Na convenção coletiva desse ano, nós pleiteamos a recomposição do salário dos 24 meses. Já que naquele momento, a gente aceitou o acordo de redução salarial. A gente aceitou, se colocou como parceiro da empresa naquele momento de dificuldade, nada mais justo que agora, nesse momento de retomada consolidada, a empresa trazer essa recomposição salarial”.
As negociações e a deflagração de greve
Em função da (contra)reforma trabalhista e da vedação da ultratividade das convenções coletivas, as empresas áreas via o sindicato patronal, SNEA (Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias), estabeleceram que se até o dia 01º de dezembro não se renovasse a convenção coletiva todos os direitos coletivos estariam vencidos.
Assim, o SNA convocou a categoria para uma assembleia e deflagrou que se até o dia 20 de novembro não se encerrassem as negociações da convenção coletiva, a categoria entraria em movimento de deliberações grevistas e assim o fez.
Segundo Clauver, as empresas apresentaram uma proposta muito aquém do que foi pedido, um documento de difícil entendimento e com uma recomposição salariam muito menor do que solicitado. Além disso, as empresas negaram a ultratividade da atual convenção coletiva, ou seja, não garantiram a manutenção dos direitos e das cláusulas atuais da convenção, caso não se feche um novo acordo até a data-base (1º de dezembro). A categoria rejeitou a proposta com mais de 6 mil votos.
“No último dia 24, a gente fez uma assembleia que convocou os aeronautas de forma presencial e deflagramos o movimento de greve. Essa deflagração foi vencida por maioria, tivemos mais de 700 pessoas na rua e mais de mil pessoas acompanhando no youtube ao vivo e a categoria decidiu por iniciar a greve na próxima segunda-feira”, informa Clauver.
Crédito: Sindicato Nacional dos Aeronautas, 2021.
O apoio da categoria ao movimento
Clauver comenta que a categoria está muito sensibilizada porque eles não pararam desde o início da pandemia, estão realizando o traslado de pessoas, vacinas, médicos e tantas outras questões fundamentais para a logística nacional.
“Nós não paramos, nosso salário foi reduzido, a gente tá bem sofrido e não é só uma questão financeira. Chega nesse momento, o sentimento da categoria é um sentimento de traição já que nós concordamos com acordos coletivos de redução de salários e você reduzir seu próprio salário é muito delicado [...] esses acordos foram aprovados com mais de 88% da categoria e chega no momento de retomada, quando os números começam a aparecer, esquecem disso. O pleito não é somente pelo financeiro, é também pelo respeito. Exigimos respeito porque nós ajudamos como podíamos naquele momento de crise”.
Principal pauta da greve
No momento da entrevista, as negociações seguiam junto ao TST e, caso se chegue a nenhum acordo, a greve está marcada para ter início na segunda-feira, dia 29 de novembro de 2021.
O diretor Clauver explica a principal pauta dos aeronautas:
“Parafraseando nosso Presidente, o Comandante Dutra, a nossa pauta é a mais singela de todas, não tocamos em nenhuma cláusula social, nenhuma cláusula operacional, nada... só queremos a retomada do nosso poder de compra. Só isso. Não trouxemos nenhuma complexidade ao debate. Só queremos recompor nosso poder de compra que está sendo esmagado!”
Última atualização: SNA aceita proposta do TST e a greve é cancelada
Ainda na sexta-feira, o TST (Tribunal Superior do Trabalho) apresentou uma nova proposta das empresas ao SNA (Sindicato Nacional dos Aeronautas) na tentativa de encerrar as negociações da convenção coletiva de trabalho desse ano.
A nova proposta prevê reajuste de 75% do INPC no salário fixo e variável e 100% do INPC nas diárias e vale alimentação.
A votação da categoria foi realizada entre a noite de sexta-feira e a tarde de sábado e os aeronautas aprovaram a proposta do TST para renovação da convenção coletiva de trabalho.
De acordo com o site oficial do SNA, 6.956 tripulantes participaram da votação, foram registrados 53,68% votos favoráveis à proposta e 45,56% votos contra. Com a aprovação, a greve dos tripulados que estava marcada para ter início a partir de segunda-feira, dia 29 de novembro, está cancelada.
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